Conseguir se autorregular em momentos difíceis, para mim, com certeza é um daqueles super poderes - e um dos mais valiosos - que vamos desenvolvendo ao longo da vida. Nem sempre é fácil, eu também caio muitas vezes; contudo, cada vez que caímos e temos dificuldade de nos regular também temos a oportunidade de rever onde precisamos trabalhar mais e quais são os pontos e as situações que mais nos tiram do nosso eixo. Cada queda, um novo aprendizado.
Por isso que acredito fielmente que a única forma de termos uma vida consciente e mais livre é nos conhecermos de verdade. Como já dizia Mahatma Gandhi, seja a mudança que você quer ver no mundo. Comecei desta forma este texto pois não vamos conseguir aprender a se autorregular de forma efetiva se primeiro não investirmos no autoconhecimento e observarmos o que faz a gente se desregular.
Quais são as suas sombras que te tiram do seu centro? Quais são as situações que lhe geram raiva? Como você lida quando se percebe sem nenhum controle sobre alguma situação ou pessoa? O que o seu parceiro(a) faz que te deixa enfurecido(a)? O que o seu filho(a) faz que você acha que não está certo e isso lhe deixa muito angustiado(a)?
Tomar conhecimento de quais são seus pontos a serem lapidados e trabalhados irá lhe ajudar muito a criar recursos suficientes de autorregulação quando essas situações voltarem a acontecer, porque acredite em mim: as situações desafiadoras vão estar sempre acontecendo, de uma forma ou outra. Nós gostando ou não, precisamos fazer as pazes com isso.
O primeiro ponto para saber se autorregular é: aceitar quando os momentos difíceis chegam e não tentar de forma desesperada não estar vivendo aquilo, seja o que for. Conseguir romper com essa percepção de evitamento e aversão ao sofrimento é o primeiro passo para nos abrirmos para a aceitação de cada momento. Queremos o tempo todo nos sentir bem e não toleramos o desconforto, mas esquecemos que só vivemos uma vida inteira se aprendemos a dançar nas polaridades da vida.
Desta forma, a aceitação é uma palavrinha chave aqui para todo e qualquer processo de autorregulação. Aceitação é ter a capacidade de ver as coisas como elas são, com sobriedade e clareza, e permitir que cada situação se apresente do jeito que está se apresentando até que ela possa se transformar. Eu gosto de dizer que a aceitação é a irmã mais velha da transformação, pois só transformamos algo, se primeiro aceitamos este algo. Porém, aceitação não é tarefa fácil, não é se colocar em uma postura passiva com a vida, pelo contrário, é se colocar numa postura ativa, pois envolve escolher ativamente se render e se entregar para o que estiver acontecendo.
Outro recurso fundamental é a gente aprender a fazer pausas regeneradora quando estivermos no olho do furacão emocional. Existe um poder profundo em fazermos pausas para que possamos ver as coisas com mais clareza, pois quando estamos no redemoinho emocional é difícil não enxergamos a situação com a lente do conflito. Mude o contexto no qual você se encontra, vá tomar um banho se tiver ao seu alcance este recurso, faça algo comportamental para sair do looping mental, fazer qualquer coisa que lhe tire do foco do conflito para permitir que você possa voltar para o seu centro.
Se conseguir, utilize a respiração como recurso para se autorregular neste momento de pausa, escute alguma música que eleve a sua energia, faça alguma meditação guiada ou se morar perto de natureza, se conecte com a natureza de alguma forma, seja indo a um parque ou indo ver o mar. Não importa o que você escolher fazer, o importante é que escolha algo neste momento que lhe dê um suspiro de calma e que neste suspiro você possa ter uma lembrança de quem você é para além do conflito. Eu, por exemplo, paro tudo e ouço deitada um mantra que me acalma durante 10 minutos e é como se aquela pausa me colocasse de volta em minha essência e eu me lembrasse quem eu sou para poder voltar e enfrentar o que estou vivendo com o olhar do meu adulto saudável e não da minha criança machucada.
Depois que você se sentir que está um pouco mais calmo(a) e pronto(a) para olhar para a situação com mais clareza, você pode se perguntar para que isto está lhe acontecendo? Utilizamos esta pergunta para que todas as resoluções daquele problema venham de um lugar de autorresponsabilidade e não de um lugar de vitimismo. Assim como, você pode pedir um instante santo, como um curso em milagres chama, para pedir para você mesmo(a), para o seu eu mais profundo, que você veja as coisas de uma maneira diferente. Eu gosto de dizer: Querido eu, como eu posso ver verdadeiramente essas situações ou essa pessoa de modo diferente? Ou dizer: Eu quero ver tal situação (aí você diz o que você está passando) de modo diferente. E permita que as soluções possam surgir naturalmente.
Precisamos também praticar a virtude da paciência, pois quando queremos genuinamente transformar algo através da auto responsabilidade e compreender os significados ocultos por detrás de cada situação desafiadora que vivemos, o campo (a vida, Deus, o Universo, chame como desejar) vai lhe trazer todas as compreensões necessárias ou pessoas que possam lhe ajudar para você sair do lugar no qual está. Todas as soluções dos nossos problemas já existem, mas precisamos saber escutar e deixar que elas se apresentem.
Lembra que referi acima sobre ter conhecimento sobre os nossos gatilhos, sombras e pontos mais difíceis? Então também precisamos ter consciência de qual é a informação que reside neste conflito/situação desafiadora. Por exemplo, se é uma situação que seu parceiro(a) fez algo que você não gostou e lhe gerou insegurança, você precisa lembrar que o seu foco de autorregulação aqui é ter recursos para que você se sinta mais segura. Poderia se perguntar: o que essa situação está pedindo que eu faça de maneira diferente para que eu me sinta mais segura comigo mesma? Como eu posso me sentir mais confiante sobre mim mesma independente do que o outro está fazendo?
Quando o conflito envolver outra pessoa, como no caso acima, por que às vezes pode não envolver, lembre sempre que o nosso ego ama ter razão. Portanto, quando estamos em uma situação de conflito o nosso ego fica querendo de maneira instintiva ter razão, é quase um mecanismo de sobrevivência que temos. Contudo, se alimentarmos esse mecanismo normalmente não chegamos em lugar nenhum. Entramos no jogo: quem é o culpado e quem é a vítima? Dessa forma, lembre: você quer ter razão ou paz? Você quer ter razão ou conexão com a pessoa que você está em conflito?
Outro recurso é lembrar que o universo não está contra nós, a vida está sempre ao nosso favor mesmo quando passamos por situações desafiadoras e achamos que a vida ou Deus está contra nós. Mas não, nunca está. A única coisa é que às vezes as coisas não estão saindo do jeito que nós gostaríamos que estivessem saindo e entramos na resistência. Criar resistência é quando pensamos: isto não deveria estar acontecendo. Contudo, se já está acontecendo, devemos aprender a aceitar e observar o que precisamos aprender com isto e não achar que aquilo não deveria estar acontecendo.
Outro recurso é refocalizar a atenção para outras pessoas para sair um pouco do foco excessivo dos nossos problemas para poder enxergar situações e pessoas para além daquilo que estamos vivendo. Conversar com amigos e pessoas que lhe façam bem, ligar para alguma pessoa querida e saber como ela está, e também claro dividir um pouco como você está. Precisamos utilizar este recurso não como uma forma de evitamento para não olhar para os seus problemas, mas sim para sair do foco excessivo da sua vida, do seu ego, da sua umbigolândia como eu gosto de dizer e ver que existem outras coisas acontecendo lá fora. Ter um equilíbrio de olhar para dentro e saber quando olhar para fora é essencial.
Para complementar este recurso da refocalização da atenção para outras situações e pessoas, um recurso valioso para este assunto também é: quando estiver passando por um momento difícil ajude outras pessoas. Eu posso dizer isso através da minha prática clínica, pois em dias que eu estou vivenciando algum conflito pessoal e não estou nos meus melhores dias, começo a trabalhar e esquecer apenas por horas as minhas questões, e além disso, me coloco a serviço do outro, sempre me sinto melhor no final do dia comparado quando eu comecei. Pode parecer um pouco egoísta essa frase, mas sim, ajudar os outros nos faz bem.
Além disso, tenha pessoas que você possa contar quando estiver muito difícil de se autorregular sozinho(a). Pessoas que sejam sensação de lar para você, para que assim você possa ser totalmente vulnerável e possa dividir suas dores sem nenhum julgamento. Pessoas que possam lhe dar novas perspectivas sobre a situação que você está vivendo. E se mesmo com ajuda de outros, com pausas para se acalmar, com a prática da aceitação e da paciência, mesmo praticando todos os recursos referidos acima for difícil de sair do redemoinho emocional e de compreender o para que daquela situação, quero te dizer algo muito importante: não se julgue e está tudo bem. Tem situações que vivemos que são difíceis mesmo, ainda mais quanto ativam sombras transgeracionais e padrões de repetições antigos que precisamos transformar.
Desta forma, peça ajuda profissional, além de ter esse suporte de amigos e pessoas que você possa contar, pois sozinho muitas vezes pode ser mais difícil. E não se confundam, aqui não estou falando sobre ser dependente dos outros para resolver os seus problemas, mas sim de relembrar que apesar de vivenciarmos todos uma jornada individual de alma, não estamos aqui para estarmos sozinhos. Poder contar com outras pessoas, terapeutas ou qualquer forma de autoconhecimento é fundamental. E para finalizar, lembre que dias de céu azul não seriam tão bonitos se não fossem os dias cinzas e que tudo, absolutamente tudo, vai passar.
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